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de Francis Hime/ Chico Buarque, 1979
Vai passar
Nessa avenida (a) um samba popular
Cada paralelepípedo
Da velha cidade
Essa noite vai se arrepiar
Ao lembrar
Que aqui passaram (b) sambas imortais
Que aqui sangraram pelos nossos pés
Que aqui sambaram nossos ancestrais (2)
Num tempo
Página infeliz da nossa história (3)
Passagem desbotada na memória
Das nossas novas gerações (4)
Dormia
A nossa pátria mãe tão distraída
Sem perceber que era subtraída
Em tenebrosas transações (5)
Seus filhos
Erravam (c) cegos pelo continente (6)
Levavam pedras feito penitentes
Erguendo estranhas catedrais
E um dia afinal
Tinham direito a uma alegria fugaz
Uma ofegante epidemia
Que se chamava carnaval
O carnaval, o carnaval
Vai passar
Palmas pra ala (d) dos barões famintos (7)
O bloco dos Napoleões retintos (e)
E os pigmeus do boulevard
Meu Deus, vem olhar
Vem ver de perto uma cidade a cantar
A evolução da liberdade
Até o dia clarear (8)
Ai, que vida boa, olerê
Ai, que vida boa, olará
O estandarte (f) do sanatório (g) geral (9)
Vai passar
Ai, que vida boa, olerê
Ai, que vida boa, olará
O estandarte do sanatório geral
Vai passar...
Comentários gerais:
(a) os desfiles de carnaval são feitos em ruas largas ou avenidas.
(b) desfilaram
(c) vagavam
(d) uma escola de samba é dividida em alas
(e) muito negros
(f) bandeira
(g) hospício
Comentários políticos:
(1) Passar pode significar "desfilar" ou "acabar". O próprio
título já é uma provocação. Dizia que um
dia a ditadura acabaria. Tornou-se um lema. Conta-se que muita gente foi presa
apenas por dizer esta frase.
(2) Até aqui dá a impressão que o assunto é só
samba.
(3) A ditadura é mencionada não explicitamente.
(4) Por que a juventude é tão alienada em relação
a um passado tão recente?
(5) A censura não permitia que se publicassem os escândalos financeiros,
as falcatruas dos políticos, etc. O povo desconhecia o que se passava,
e isto era o paraíso para os corruptos, que tinham assim assegurada a
impunidade.
(6) Muitos ativistas políticos foram exilados em países vizinhos,
outros foram para a Europa.
(7) Uma crítica social. Os foliões se vestem de barões,
de reis, etc, mas muitos são famintos e miseráveis.
(8) Um tema recorrente nas músicas da época. A volta das liberdades
políticas é comparada ao amanhecer, bem como a ditadura é
comparada à noite.
(9) Uma crítica à estrutura ilógica de poder montada pelos
militares.
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